Na semana em que o atual presidente brasileiro determina a celebração de um período — não tão distante — e que deveria ser motivo para envergonhar a nação brasileira e despertar a consciência para que ele nunca mais ocorra: a ditadura militar, instaurada em primeiro de abril de 1964 e finalizada no dia 15 de março de 1985, se faz necessário o resgate das imagens do período mais cruel do país.
Sob comando de sucessivos governos militares de caráter autoritário e nacionalista, o golpe militar derrubou o governo de João Goulart, o então presidente democraticamente eleito e terminou somente quando José Sarney assumiu a presidência, inaugurando a Nova República. Embora as promessas fossem de uma intervenção breve, a ditadura militar durou 21 anos.
O regime seguia uma diretriz nacionalista, desenvolvimentista e de oposição ao comunismo. A ditadura atingiu o auge de sua popularidade na década de 1970, com o “milagre econômico”, no mesmo momento em que o regime censurava todos os meios de comunicação do país e torturava e exilava dissidentes.
Na década de 1980, assim como ocorreu com outros regimes militares latino-americanos, a ditadura brasileira entrou em decadência quando o governo não conseguiu mais fazer a economia crescer, controlar a hiperinflação crônica e os níveis crescentes de concentração de renda e pobreza provenientes de seu projeto econômico.
Ao deixarem o poder em 1984, a dívida representava 54% do PIB segundo o Banco Central, quase quatro vezes maior do que na época que eles tomaram o poder em 1964, quando o valor da dívida era de 15,7% do PIB. A inflação, por sua vez, chegou a 223%, em 1985. Quatro anos depois, o país ainda não tinha conseguido se recuperar e ostentava um índice de inflação de 1782%.
Além de ter deixado uma herança econômica maldita, a ditadura militar torturou e matou uma lista extensa de pessoas. A Comissão da Verdade estipula que pelos menos 191 brasileiros que resistiram à ditadura foram mortos, 210 estão até hoje desaparecidos e foram localizados apenas 33 corpos, totalizando 434 militantes mortos e desaparecidos. E os agentes dos órgãos de repressão do Estado que foram até agora identificados, responsáveis pelas torturas e assassinatos, totalizam 337.
EVANDRO TEIXEIRA
Um dos fotógrafos que se destacou na época é o Evandro Teixeira, hoje com 84 anos. Ele é o autor da foto da tomada do forte de Copacabana na madrugada do dia 31 de março pro dia primeiro de abril.Confundido com um fotógrafo do exército, Evandro, que trabalhava pro Jornal do Brasil, entrou no Forte de Copacabana e fez os primeiros registros do golpe.
Em entrevista ao Terra em 2014, o fotógrafo relembrou a fatídica madrugada: “Eu morava na rua Júlio de Castilhos, em Copacabana, e jogava voleibol com um grupo de amigos no posto 6. Entre eles estava o Lino, capitão do time. Pois na madrugada do dia 1º de abril, Lino apareceu na minha casa e disse: “Olha, a revolução estourou e o forte está sendo tomado – quer tentar entrar comigo?” Escondi minha Leica (câmera fotográfica) e fomos. Ele então disse: “Se entrar entrou, mas se não entrar você não me conhece, senão fica ruim para mim”. Chegando lá Lino bateu continência, eu bati também, falei qualquer coisa e entrei. Enrolei a voz. Fomos direto para a sala de comandantes. Em seguida chegou o (marechal) Castello Branco com um monte de oficiais. Continuei por lá fotografando todos, formados. O mais engraçado é que eles achavam que eu era fotógrafo do exército. Mandavam eu tirar uma foto aqui, outra ali. Todo mundo fazia pose, todos durões. Passados alguns minutos, o Leno piscou os olhos como quem diz “tá bom, te manda”. E eu me mandei. Foi assim que fui o único a registrar aquele momento.”
AMARGA MEMÓRIA
Rememorar é uma forma de nunca esquecer as atrocidades daquele período. Veja abaixo alguns registros mais simbólicos da ditadura militar no Brasil.
Tomada do forte de Copacabana durante golpe militar em 1964. Foto: Evandro Teixeira
Estudante de medicina durante protesto na Cinelândia, em 1968. Foto: Evandro Teixeira
Cavalaria da polícia avança sobre estudantes que realizavam missa pela morte do estudante Edson Luís, em 1968. Foto: Evandro TeixeiraMovimento pela anistia , em São Paulo, em 1979. Foto: Juca Martins Criança empunha metralhadora de brinquedo durante greve dos metalúrgicos, em São Bernardo do Campo, em 1980. Foto: Juca Martins. Estudante carregado por militares após confronto, no Rio de Janeiro. Foto: Evandro Teixeira Corpo de Aurora Maria Nascimento Furtado, assassinada aos 26 anos após ser torturada por agentes do governo militar, no Rio de Janeiro, em 1972. Foto: Nair Benedicto em exposição na mostra Terra em Transe, no Centro Dragão do Mar Arte e Cultura, em Fortaleza. Foto do corpo do jornalista Vladimir Herzog morto na cela do DOI-CODI de São Paulo. A foto foi usada para confirmar a versão de suicídio dada pelos militares na época.
Foto: Sivaldo Leung
Uma das imagens mais representativas do desgaste da ditadura militar no Brasil. Rachel Coelho Menezes de Souza, mais conhecida como Rachel Clemens, foi fotografada no momento em que se recusava a estender a mão para o então presidente, o general João Baptista Figueiredo. Imagem se tornou símbolo contra a ditadura na época. Foto:
Guinaldo Nicolaevsky